Entre mortes e esperança.

Eu podia jurar que teria um fim. Enquanto eu caminhava pela longa estrada, me vinham à mente algumas memórias. Memórias simples, aparentemente insignificantes: uma foto, uma música, um olhar. Um olhar; aquele olhar. O dia em que minha vida virou do avesso com aquele misto de paixão e timidez. E aquela pele macia roçando a minha. Aquele cheiro de café se misturando ao cheiro de cigarro. Algumas outras memórias errôneas, sem sentido. E enquanto os pensamentos enchiam minha cabeça, minhas pernas se moviam, quase que automaticamente, buscando o fim, o fim daquela escuridão, o fim daquela estrada que parecia aumentar dois quilômetros a cada um que eu andava.
Andava em meio aos quase mortos, aos fingidos. Era quase uma ofensa me sentir diferente deles; nossas situações eram as mesmas. Éramos pessoas correndo atrás de um propósito, um propósito para continuar. Éramos pessoas perdidas num ciclo infinito onde andávamos à procura de motivos para continuarmos andando. Mas eu jurava que teria um fim.
Passei por uma placa maltratada pelo tempo, uma placa que continha algumas palavras. Mas eu era capaz de ver frases ali, textos. Textos que me lembravam a luz, não só do dia, mas também dos lindos olhos de alguém. Algumas palavras perdidas me davam forças pra continuar caminhando ao ativarem lembranças de um tempo bom. Esperança sempre foi meu forte. Na verdade, acreditar no improvável sempre foi meu forte.
Até que, de uma hora pra outra, fraquejei. Encontrava-me de joelhos, não sei se por sede, fome, ou alguma dessas necessidades básicas. Minha fraqueza já me pregava peças:
- Não vê que estamos sem saída? - reclamava minha mente.
- Sempre há uma saída. - eu retrucava.
- Você sabe que não é verdade. Você sabe que algumas guerras simplesmente não são ganhas. Perdemos essa, vamos voltar.
E com a insistência que era minha de praxe, com a birra que guardo em mim desde criança, resolvi não dar ouvidos ao meu eu. Como se algo maior me aguardasse, continuei. Ao olhar para os lados percebi que estávamos todos assim. Caminhávamos contra nossa vontade, simplesmente pela vontade de ir contra os fatos, pela impossibilidade de aceitar. Negávamos, negávamos para nós mesmos a verdade que não condizia com nossas vontades.
Após dias de caminhada, era fácil ver alguns desistindo de continuar com a insanidade. Era fácil olhar pro lado e ver tudo em preto e branco ou em algum tom que me lembrasse vida. Ah, vida... Era atrás dela que eu estava correndo. Irônico era o modo como eu o fazia: desvivendo. Era como rasgar a pele do teu braço direito pra com ela cobrir a ferida do braço esquerdo. Era como estancar uma ferida e mergulhar em outra. Já não fazia mais sentido. Não fazia sentido nem mais para meu segundo "eu" que negou os pensamentos do primeiro. Ainda assim eu prosseguia com minha fé cega.
E caminhei ali, eternamente, na estrada da angústia. Eu poderia jurar que teria um fim. Mas minha mente estava certa. Aquela estrada não tinha uma saída simplesmente por não acabar. Um eterno começo-e-meio no qual eu me perdi tentando me encontrar.

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“A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade.”