Chove.
Chove lá fora e chove aqui dentro.
Chove pra espantar o calor e chove pra apagar a alegria.
Chove pra matar a sede e chove pra matar as esperanças.
Chove porque tem que chover e chove pra me deixar confuso.
Chove pra encher os rios e chove pra encher meus olhos.
Chove pra sobrevivência e chove pro desejo de partir.
Chove lá fora e chove aqui dentro. Dentro de mim.
Mas eu sei que depois da chuva sempre vem o sol.
Enchente.
Ninguém sabe.
Partimos cedo, quase de madrugada. Fazia frio e o sol ainda não aparecia por inteiro no horizonte. Viajamos entre as poeiras e as sobras em busca da felicidade. Tínhamos ouvido falar muito dela e queríamos conhecê-la. Seguimos cada coordenada, cada receita. Tínhamos essas tais "regras" para obedecermos e as obedecemos à risca. Não ultrapassamos nenhum dos limites, andamos com muita calma.
Depois de milhões de passos, estávamos mais próximos. Os céus gritavam em tons alaranjados, os pássaros voavam com toda a leveza possível, tudo parecia tão certo. Até que surgiu algo; algo que nos impedia de seguir em frente; algo que nos impedia de alcançar a tão cobiçada felicidade. Um buraco. Profundo, escuro, impossível de atravessar. O pensamento de “o que eu fiz de errado?” inundou nossas mentes. E ali estávamos nós, nos entreolhando em busca de respostas. E ficamos ali, parados, apenas esperando pra ver quem desistiria primeiro.
E, sem palavras, sem sinais, nós dois desistimos. Voltamos pela longa estrada da vida. Voltamos de braços abertos às nossas rotinas, aos nossos dias sempre entediantes, às nossas normalidades insanas. Voltamos para as poeiras e as sobras. Seguimos pela sombra, pelo caminho mais fácil e seguro.
Hoje olho pra trás e me pergunto: o que teria acontecido se tivéssemos arriscado atravessar aquele buraco? Quantas vezes não nos limitamos a ficar em apenas uma parte das estradas de nossas vidas por medo?
Ninguém sabe.